Trilogia Três Atos



Saudações nobres,
Mais uma crítica de trilogia. E houve um esforço imenso em manter a maioria dos spoilers de fora. Acho que vale uma visão geral dos livros, para ter certeza se vale a pena investir na leitura do primeiro. “Nove noites” foi comprado na Bienal do Livro de Minas Gerais de 2014, primeiro porque fiquei apaixonada pela capa e, segundo, porque tenho completa paixão por Sonho de uma noite de verão.
A trilogia é rápida e com muita ação, pontuadas por alguns clichês – não que eu veja problema nisso –. A edição foi cuidadosamente elaborada, páginas amarelas e arabescos aqui e ali. A escrita de Lesley Livingston é dinâmica, sem longas descrições e apresenta um mundo mágico repleto de criaturas do imaginário humano. Para os não familiarizados com as temáticas das Cortes, será uma grata surpresa; para os iniciados, será divertido e prazeroso reviver alguns personagens na visão da autora. Os personagens foram bem construídos e é fácil se apegar a eles, também é fácil ser enganada por eles: ainda que os seres mágicos não possam mentir.
Recomendo que depois possa folhear as peças de Shakespeare citadas nos livros. Complementam de forma primorosa a leitura e o trabalho da autora.
Ps.: Definitivamente achei as capas brasileiras mais bonitas.


Nove Noites e Um Sonho de Outono (Ato #1)
Lesley Livingston
Gutenberg
320 páginas
2014

Kelley Winslow está vivendo seu sonho. Aos 17 anos de idade, ela se muda para Nova York e começa a trabalhar em uma companhia de teatro. Ela ainda é, claro, apenas uma assistente e eventual substituta, mas um dia as coisas começam a mudar: a atriz que interpreta a protagonista Titânia em “Sonho de uma noite de verão”, de Shakespeare, sofre um acidente, e ela tem uma chance de assumir o papel principal. Nesse mesmo dia, ela passa a perceber que o mundo mágico é mais real do que pensava. Ela conhece um lindo jovem chamado Sonny Flannery, a atração entre os dois é imediata, mas o rapaz é, na verdade, um dos guardiões do portal do Samhain, que dá passagem para o outro mundo. A cada solstício de inverno, o portal se abre, mas a cada nove anos ele permanece aberto durante as últimas nove noites do outono. E é nesse breve tempo que ela, ao descobrir sua verdadeira descendência, se vê ameaçada por uma terrível trama, que coloca em perigo o mundo real, o mundo encantado e a promessa de viver um amor verdadeiro.

Há quem diga que todas as noites são de sonhos. Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão. No fundo, isto não tem muita importância. O que interessa mesmo não é a noite em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre, em todos os lugares, em todas as épocas do ano, dormindo ou acordado.
Sonho de uma noite de verão – Shakespeare
No primeiro volume, temos Kelley começando a viver o sonho de ser uma grande atriz. Ela é bem normal, como toda protagonista que terá a vida virada de cabeça para baixo deveria ter.
O primeiro passo para a reviravolta, é o encontro com o Guardião Jano, Sonny, seguido por salvar um cavalo de se afogar. Sonny é do tipo difícil de não se apaixonar. E só isso seria suficiente para bagunçar um pouco as coisas.
Mas tudo se intensifica quando Kelley descobre sua verdadeira origem, sua herança e todos os seres mágicos que vivem na terra. O solstício de inverno daquele ano é aguardado e poderá desencadear o fim do mundo como os humanos e os seres mágicos conhecem, e Kelley terá papel fundamental nisso.
Mab e Auberon não são exatamente bons exemplos de pais ou governantes, embora haja necessidade de perceber que o Bom Povo não se parece com os humanos – e não estou falando da imortalidade – seus jogos de palavras e a habilidade de transformar indivíduos em peões é surpreendente. A dimensão das mentes é difícil de acompanhar. Estamos tratando de seres que raptam crianças humanas por diversão, para terem uma guarda, para mudar um pouco a paisagem eterna. E temos a audácia e dor humanas, operando milagres e tomando para si algo como o Reino Mágico fez.  Além disso, os seres mágicos são incríveis, com suas habilidades e belezas fora do comum, e de alguma forma todos serão responsáveis por maiores ou menores participações.  
A descendência de Kelley é fascinante, a magia que a compõe é ao mesmo tempo, oposta e complementar. Ela descobrirá que o orgulho dos monarcas das cortes é assombroso e isso influenciará as suas decisões no decorrer da trilogia. O primeiro livro é a porta de entrada para o que vem a seguir e uma boa introdução. E não faltam emoções ou batalhas épicas em Nove Noites. O fato é que, a Princesa precisará lidar com sentimentos demais, perdas e mais insanidades do que poderá ser capaz de suportar.
O final do primeiro livro deixa a protagonista com o coração apertado, partido, e carregado de tristeza. É também um gancho desesperador: aconselho a ter o segundo volume nas mãos.
Juntos, eles observavam enquanto o sol, enfim, afundava completamente sob o horizonte e o parque mergulhava na escuridão. A primeira das Nove Noites começara. Pág. 48

  

À espera de Romeu (Ato #2)
Lesley Livingston
Gutenberg
304 páginas
2016

Kelley ainda está aprendendo a lidar com o fato de que é a Princesa das Fadas e que possui magia em seu sangue. Ela só não esperava descobrir que, na verdade, o poder mais intenso e perigoso para qualquer ser, mortal ou imortal, é o amor. Depois de salvar o Reino Encantado da Caçada Selvagem, Kelley se vê novamente presa em Nova York, ensaiando a sua nova apresentação no teatro, a peça Romeu e Julieta, e sentindo a falta de Sonny. Sonny faz parte de uma força do reino mágico conhecida como Guardiões Janos, mortais que tinham sido raptados ainda bebês, em várias épocas e locais, e levados para viver no Reino encantado. Agora Sonny estava lá cumprindo seu papel, enfrentando o que restou da Caçada Selvagem e tentando controlar a temível Rainha Mab. 
Até que, por acidente, Kelley retorna para o Outro Mundo e revê magia oculta retorna ao reino, e um novo inimigo, extremamente perigoso, está disposto a arriscar tudo para reivindicar o poder que acredita ter direito. Presos no país das fadas em uma teia de mentiras, Kelley e Sonny precisarão ser cautelosos em cada estratégia na missão de salvar o mundo mágico novamente. Qualquer ação errada poderá resultar na derrubada do reino... ou separá-los para sempre.

 A despedida é uma dor tão suave que te diria “Boa Noite” até o amanhecer.
Romeu e Julieta – Shakespeare
O segundo volume traz Kelley mais consciente de quem é, mas também mais sobrecarregada com as responsabilidades de seus poderes e suas ações. Em alguns momentos, ela chega a ser irracional e – no meu ponto de vista – mimada. Não que não tenha motivos para se revoltar contra um destino que armam para ela, contra todas as mentiras tecidas com cuidado e contra o fato de não poder fazer tanto quanto queria. Ela tem todos os motivos, discordo da forma como ela conduz as coisas.
Sonny fora mandado para longe, em uma tarefa arriscada. A sua promessa parece complicada de ser cumprida e os problemas assolam Kelley como nunca antes.
Os acontecimentos perdem total controle quando uma notícia impossível da Corte do Inverno chega pelas palavras do bucca. Alianças são feitas e decisões erradas serão tomadas. Kelley teimosamente fará escolhas dúbias que terão consequências futuras.
Os personagens do primeiro livro tomam seus lugares no segundo volume, e podem ser melhores explorados. Os Guardiões Janos serão apresentados de forma mais detalhada, e será possível entender o que os move.
Apesar de em Nove Noites o perigo ter sido imenso e Kelley ter certeza de que não conseguiria, À espera de Romeu carrega consigo um perigo muito maior: seja para os outros quanto para o seu coração. E é então que ela toma a decisão mais extremada – e burra – de sua vida.
No final, Kelley está ciente de suas ações e do que elas podem causar. E ainda assim, ela está disposta a salvar o mundo sozinha. A princesa se dá conta de que todo o acontecido faz parte de um plano muito maior para derrubar as Cortes do Outro Mundo e trazer instabilidade aos habitantes mágicos e humanos. Resta saber quem está por trás disso.

De pé, ali, ela ouviu o seu próprio coração se partir. Momentos que pareciam vidas inteiras desfilaram como uma parada triste diante de seus olhos secos, enquanto aquela mentira hedionda faria seu trabalho sujo e deplorável. Pág. 265

  

A tempestade (Ato #3)
Lesley Livingston
Gutenberg
304 páginas
2017

“Eu não amo Sonny Flannery!” Quando percebeu que era o ponto fraco de Sonny, Kelley não teve outra opção a não ser mentir para proteger a vida de seu grande amor. Na terrível batalha que devastou o teatro de sua companhia, a herdeira do Reino Encantado descobriu que a verdade a respeito da origem de Sonny esconde um perigoso segredo, de que nem mesmo ele tem consciência. E renunciar ao homem que ama é o único modo de mantê-lo a salvo. O plano dá certo! Desorientado e devastado, Sonny foge e acaba descobrindo um refúgio subterrâneo em plena cidade de Nova York, habitado por vários seres mágicos perdidos. Ao fazer amizade com eles, Sonny descobre que desde os eventos desencadeados pelas Nove Noites o lugar vem sofrendo misteriosos ataques, e fica muito intrigado ao perceber que as marcas deixadas nas vítimas lhe são familiares. Uma guerra está começando a se armar. O portal entre os mundos está cada vez mais instável, e seres mágicos revoltosos estão começando um levante junto de traidores que se infiltraram entre os lendários Guardiões Janos. Uma nova fonte de poder incalculável está se manifestando, atraindo a ganância de seres mágicos poderosíssimos que querem se apossar dela para dominar os dois mundos. Mas Kelley não está disposta a permitir que isso aconteça. Agora, mais do que nunca, ela precisa dominar seus poderes para conseguir reunir todos os aliados que puder para desvendar quem está por trás de tudo e derrotar o inimigo, além de descobrir um meio de ter Sonny de volta com vida. “A Tempestade” é o terceiro volume da série criada por Lesley Livingston. Os dois primeiros volumes são Nove noites e um sonho de outono e À espera de Romeu.

"Esses atores eram todos espíritos e dissiparam-se no ar, sim, no ar impalpável. Um dia, tal e qual a base ilusória desta visão, as altas torres envoltas em nuvens, os palácios, os templos solenes, e todo este imenso globo hão de sumir-se no ar como se deu com esse tênue espetáculo. Somos feitos da mesma substância dos sonhos e, entre um sono e outro, decorre a nossa curta existência."
A Tempestade – Shakespeare
Salve o teatro. Salve Sonny. Salve o mundo. Salve a si mesma.

O livro final da trilogia chega para continuar destruindo o coração dos leitores. Acompanhei piedosamente todas as lágrimas e dores de Kellsey. A defendi, a culpei e por fim, cheguei ao ponto de entendê-la. E mais importante: ela consegue se entender, ela se dá conta do que carrega e de como terá que conviver com tudo aquilo. As crises acabam e ela passa a ser uma personagem forte e independente, carregando um plano perigoso dentro de si.
Ela também é capaz de perdoar, de compreender as ações dos seres mágicos como antes não conseguia. O peso que é retirado de suas asas transforma a força e a aparência da princesa.
As atitudes de alguns personagens pegarão o leitor de surpresa, e pode ser que passe por aquele momento tenso em que a vontade de colocar o livro na prateleira e remoer aquele sofrimento apareça.
Os sentimentos de Kelley e Sonny são complexos e profundos. Bem como a força de vontade e coragem deles. Como a sinopse adianta, uma guerra está para começar. Kelley precisa ser mais forte do que todos os outros para vencê-la. E toda ajuda será bem vinda. É o livro mais agitado da trilogia, e de longe o melhor deles.
A trilogia me surpreendeu e evoluiu com graça. O final não deixa a desejar, as pontas soltas são amarradas e não há qualquer motivo para reclamar de como as coisas findaram. O Reino Mágico é difícil de decifrar e seria estranho – e desanimador – se não fosse assim.
Sempre me pergunto os motivos que levam Mab a ser uma rainha tão temida e retratada como vilã. Titânia me irrita com todas as suas cores e brilho, e não entendo como Outono pode carregar tanto caos e escuridão. De todos, eu sempre admirei a grande Rainha do Outono.

“Há sempre dois lados em cada história, Kelley. (...) Se você está interpretando o ‘vilão’, você nunca vai se ver realmente como mau. Apenas os seus motivos são frequentemente mal interpretados por todos os demais.”


Lesley Livingston
Lesley Livingston é escritora e atriz, e mora em Toronto, no Canadá. Tem mestrado em Inglês pela Universidade de Toronto, onde também se especializou em Literatura Arturiana e Shakespeariana. É cofundadora do Grupo de Teatro Tempest, com o qual se apresenta. Desde criança, é fascinada por histórias de mitologia e folclore, civilizações antigas e heróis lendários, e acabou se tornando especialista em mitologia grega e celta, esta última, rica em contos de outros mundos, magia e lendas do rei Artur. Sua intensa atividade cultural não a impede de cultivar outras paixões um pouco menos “intelectuais”: confessa que ama sem culpa sapatos e coisas brilhantes.


Livros publicados
Trilogia Três Atos
Nove Noites e um sonho de outono (2014)
À espera de Romeu (2016)
A Tempestade (2017)

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2 comentários:

  1. Ainda não tinha ouvido falar da serie, nem autora. Mas confesso que já estou gostando do Sonny, senti uma pegada de instrumentos mortais ( o lance de vários seres mágicos), as personagem principal sempre são confusas e mimadas e tem hora que dá raiva é sempre assim né? Lembro de quando lia a série Sussuro as vezes queria matar Nora muita chata, mas deu tudo certo no final! ótimas resenhas! Bjs!

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    1. Saudações Lady Ana Lima,
      Existe mesmo um ar de Instrumentos Mortais, mas nada que possa ser comparado.
      Sim. Acho que as autoras precisam de personagens mais maduras. Não é possível hahahaha
      Nessa tudo acaba sem que queiramos matar ninguém.
      Obrigada!

      A Rainha agradece a vossa visita!
      Demore o quanto quiser, serás sempre bem-vinda.
      Att
      Ana P. Maia ♛

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